O Distrito Federal vai ter que pagar R$ 80 mil de indenização por danos morais e 1 salário mínimo mensal de pensão vitalícia à mãe de um menino que sofreu paralisia cerebral durante parto na rede pública de saúde. A decisão recursal da 2ª Turma Cível do TJDFT manteve na íntegra a sentença condenatória da juíza da 5ª Vara da Fazenda Pública do DF. Não cabe mais recurso ao TJDFT.
A mãe conta que na madrugada do dia 6.3.2002 deu entrada no Hospital Regional do Gama, em trabalho de parto gemelar, acompanhada da cunhada. Após mais de 14 horas de contrações, o primeiro bebê nasceu sobre uma maca, no corredor do hospital, sem qualquer auxílio médico. Lúcida e consciente, ela foi conduzida à enfermaria para a realização do segundo parto. Por estar exausta, solicitou à medica responsável que fosse feita uma cesárea. O pedido foi negado.
Após uma hora e meia do nascimento do primeiro gêmeo e várias tentativas frustradas de retirada do segundo bebê, por ordem da médica, três enfermeiras se aproximaram de seu leito e subiram nela com o intuito de empurrar o feto. Nesse momento, ele foi puxado pelas pernas, vindo a nascer totalmente cianótico (ou seja, azulado) e sem chorar. No dia seguinte, ela foi informada que o bebê corria alto risco de morte, era alimentado por soro, sofrera transfusões de sangue e respirava com ajuda de aparelhos. Durante um mês e oito dias, ficou internada no Hospital do Gama, aguardando a alta do recém-nascido. O laudo do hospital atestou que o menino nasceu de 8 meses, era 2º gemelar, estava sentado no momento do parto e apresentou asfixia perinatal grave (falta de oxigênio).
Em relatório médico da Rede SARAH juntado ao processo, o autor foi diagnosticado com paralisia cerebral do tipo tetraplegia mista, com atraso cognitivo e deficiência auditiva e indicou como fator de risco para a lesão cerebral gemeralidade e anóxia neonatal.
O Distrito Federal contestou os pedidos de indenização, negando que tenha havido negligência ou erro médico no atendimento à gestante. De acordo com o ente estatal, a cesariana não foi realizada porque o intervalo entre o nascimento do primeiro e do segundo gemelar estava dentro dos padrões recomendados pela doutrina médica. E mesmo que fosse feita a cesárea, o procedimento não seria suficiente a afastar as sequelas do autor, já que seria necessário tempo razoável para a preparação da sala de cirurgia.
Ao condenar o DF, a juíza de 1ª Instância discorreu sobre a teoria do risco administrativo, que imputa ao Estado a responsabilidade objetiva por ações ou omissões na prestação do serviço público: "O risco administrativo baseia-se no princípio da igualdade de todos perante os encargos sociais e encontra raízes no art. 13 da Declaração dos Direitos do Homem, de 1789, segundo a qual para a manutenção da força pública e para as despesas de administração é indispensável uma contribuição comum que deve ser dividida entre os cidadãos de acordo com suas possibilidades".
Para a magistrada, isso significa que: "Assim como os benefícios decorrentes da atuação estatal repartem-se por todos, também os prejuízos sofridos por alguns membros da sociedade devem ser repartidos. Quando uma pessoa sofre um ônus maior do que o suportado pelos demais, rompe-se o equilíbrio que necessariamente deve haver entre os encargos sociais. Para restabelecer esse equilíbrio, o Estado deve indenizar o prejudicado, utilizando recursos do erário público."
No julgamento do recurso ajuizado pelo DF contra a decisão da juíza, os desembargadores, à unanimidade, mantiveram o mesmo entendimento. |